quarta-feira, 9 de março de 2016

Reflexões: E a identidade da mulher?

Quando comecei a ler as homenagens feitas à mulher por conta de seu dia, a imagem que me veio à mente foi de muita hipocrisia e pouco reconhecimento dos seus verdadeiros valores.

Grande parte dos textos mostram o seu grande valor como “escrava do homem e dos filhos”, reverenciando a sua capacidade de enfrentar, com alegria, sua dupla ou tripla jornada.

Os textos parecem elaborados visando convencê-la de que a sua importância está exatamente em enfrentar tudo isso e, ao final do dia, estar linda, bem cuidada e maravilhosa, para satisfação de seu homem.

Preferi, então, nada publicar ontem! Eu estaria na contramão da cultura machista, disfarçada por um reconhecimento que me parece, no mínimo, equivocado.

Já nos afastamos, há alguns milhares de anos, do período das cavernas, mas mantemos um relacionamento de superior para inferior, súdito ou subserviente, onde as exceções ainda são tão poucas, que ainda chamam a atenção pela sua estranheza!

Mas a minha observação de hoje está baseada apenas em um pequeno detalhe de tudo isso. Um detalhe que comecei a sentir a partir do momento em que o avançar da idade mais uma vez me surpreendeu com um evento novo: o prazer das boas recordações!

Mas por que razão eu estou ligando o prazer das boas recordações com o desprazer de ver a mulher ainda tratada como um ser inferior?

Porque um dos aspectos mais evidentes dessa terrível inferioridade cultural está na perda da sua identidade, registrada no momento em que ela se junta, oficialmente, a um homem!

Uma perda de identidade consolidada pela perda do sobrenome, assumindo um nome de uma família que não lhe pertence, assumindo uma genealogia estranha à sua, mas que passa a dirigir toda a sua vida desde então.

Anulou-se a mulher que existia até então. Toda uma vida arquivada com um sobrenome que foi desprezado ou, no mínimo, deslocado para uma posição secundária.

Sim! Isso pode parecer uma declaração estranha e, talvez, fora de hora, mas é o que sinto.

A maioria das mulheres aceita isso com naturalidade, e por vezes até com orgulho, como acontecia com minha mãe.

Ela adorava ser apresentada em público como a excelentíssima Sra Ministro do Superior Tribunal Militar Roberto Andersen Cavalcanti, em vez de pelo seu nome de batismo, Zenith Príncipe Bailly, antecedido pela qualidade de poetiza...

Mas isso contribui para reduzir em muito, e por vezes até em destruir totalmente, esse maravilhoso prazer, surgido após o amadurecimento saudável e feliz, das boas recordações!

Por vezes sentimos a necessidade de transformar a recordação em imagem real, em apreciar a trajetória de vida dessas pessoas que muito nos marcaram.

E é nesse momento que recebemos o duro golpe da anulação da identidade!

Onde está L. V., minha eterna paixão, quando ambos tínhamos nove anos de idade, e cursávamos a terceira série primária no Externato Aragón, em Niterói? Um verdadeiro amor platônico, até o dia em que eu tive a coragem de declarar todo o meu amor, não a ela, mas à sua mãe... foram duas mães surpresas com o fato! E eu envergonhado, nem conseguia mais olhar nos olhos dela...

O que aconteceu com D. M., N. D., L. S., D. U., cada uma representando uma fase de descoberta do amor infantil, passando pelo período da adolescência e entrando na juventude?

Cada uma delas tinha um sonho de realização profissional. Mas o casamento certamente modificou seus planos.

A mudança no rumo da vida pode ter significado uma anulação da sua satisfação profissional e pessoal e o impedimento de que uma recordação como essas reacenda a chama de um amor infantil!

Houve a tradicional anulação de identidade causada pela mudança do sobrenome.


E, infelizmente, ainda não temos aplicativos de busca que nos traga, de volta, a imagem de um amor que mudou de endereço, de nome, de cultura individual e de identidade pessoal!

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