segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Ateísmo pseudo-religioso e ateísmo pseudocientífico

O título pode até parecer estranho ou polêmico, mas não é essa a minha intenção! Preciso apenas mostrar uma triste realidade: Existe, e é preocupante, um grande número de intransigentes e extremistas, e que muitas vezes nem se apercebem de seu próprio erro. Esse comportamento é o que chamo de ateísmo em suas duas formas mais perniciosas: de um lado o pseudo-religioso e, do outro, o pseudocientífico.
Se as consequências desse tipo de pensamento obtuso fizessem mal apenas aos próprios, eu não ficaria tão preocupado. Mas as crianças e adolescente que convivem com eles poderão absorver tais atitudes e, infelizmente, terem seu desenvolvimento intelectual prejudicado.
Sabemos que a criança e o adolescente tendem a eleger seu professor como seu mentor, mesmo inconscientemente. Isso significa que suas palavras, suas atitudes e sua forma de pensar podem estar sendo construídas sob a influência desse professor.
E se a intelectualidade plena de nossos alunos, junto com a formação de seu caráter, é o nosso mais importante objetivo, temos que fazer alguma coisa urgente, para evitar a formação de mais uma geração de “limitados”!
Afinal, nossos jovens precisam estar aptos para, a qualquer momento, conseguir compreender o que ouvem e o que leem e, ao mesmo tempo, ter o devido entusiasmo para descobrir fundamentos que os auxiliem a elaborar os necessários questionamentos para quem quer saber mais do que, simplesmente, o conhecimento elementar. Eles precisam ser estimulados a isso! E nunca a atitudes intransigentes...
Mas para conseguir avançar nessa etapa do processo de ensino o educador precisa, antes de qualquer preparação técnica ou metodológica de suas aulas, “se livrar” do que lhe resta desse ateísmo religioso ou científico ou, como eu chamei no título dessa conversa, ateísmo pseudo-religioso e pseudocientífico.

Ateísmo pseudocientífico

E o que é o ateu pseudocientista? É aquela pessoa que se apoia em frágeis conhecimentos científicos para se sentir o “dono da verdade” e contestar tudo o que está fora da sua capacidade de entendimento. Basta observarmos a intransigência de alguns educadores, principalmente acadêmicos recém-formados, no que diz respeito ao olhar da tradição religiosa para os mistérios do mundo! Como acabaram de estudar as maravilhas do rigor científico e a metodologia da pesquisa, acham que conseguiram “entender” uma série de “teorias científicas” explicando praticamente tudo.
São mais realistas do que o rei, pois conseguem ter mais certeza nos resultados científicos do que os próprios cientistas. Já os verdadeiros cientistas, mesmo com todo rigor da pesquisa e com todo conhecimento adquirido ao longo de muitos anos de estudo e experiência de vida, continuam tendo dúvidas sobre a interpretação dos resultados de suas experiências e cálculos. Esses ainda mantém a humildade de respeitar conceitos tradicionais, já que sabem ser muito difícil o domínio da verdade absoluta.
Os pseudocientistas ignoram e negam tudo o que não compreendem, ao invés de assumir a humildade da ignorância. Não defender como verdade aquilo que não esteja provado em laboratório é sua obrigação, mas considerar falsos os conceitos tradicionais por não entendê-los ainda, é uma atitude infantil.
A verdade possui três caminhos de entendimento. O caminho científico é o da experimentação. O caminho filosófico é o da especulação. O caminho teológico é o da tradição. Nenhum dos três deve ser ignorado. Mas nenhum dos três é autossuficiente.
Como bem disse Marcelo Gleiser na página 41 de seu livro “Criação Imperfeita: Cosmo, Vida e o Código da Natureza” (Rio de Janeiro: Editora Record, 2010), referindo-se ao trabalho contra a religião feito atualmente pelos cientistas, filósofos e jornalistas ateus chamados de “Os quatro cavaleiros do apocalipse”: “(...) Ridicularizar essa necessidade humana, como fazem os “Quatro Cavaleiros” e tantos outros, é demonstrar uma profunda ignorância (ou indiferença?) do que passa pelos corações e mentes de bilhões de pessoas espalhadas pelos quatro cantos do mundo.” (pg. 41).
Eu ainda digo que ignorar a parte teológica do conhecimento é se achar em um nível de conhecimento superior a todos os demais habitantes desse nosso planeta... Afinal, nossa inteligência e nosso conhecimento ainda estão muito aquém do que precisamos para negar com propriedade qualquer conceito sobre os grandes mistérios do mundo!
Afinal, nossas capacidades de ver e ouvir ainda são muito incipientes. Como disse Maturana: “(...) Não vemos o “espaço” do mundo, vivemos nosso campo visual; não vemos as “cores” do mundo, vivemos nosso espaço cromático (...)” (pg.28 de Maturana, Humberto R. e Varela, Francisco J. “A árvore do conhecimento: as bases biológicas da compreensão humana”. São Paulo: Palas Athena, 2001).
Nem Stephen Hawking, um dos mais famosos cientistas britânicos, desprezou a possível interferência de Deus para dar um “empurrãozinho” na compreensão científica do universo. Em seu livro Uma Breve História do Tempo, de 1988, Hawking dizia que a ideia de uma criação divina poderia estar incluída na compreensão científica do Universo: “(...) Se nós descobrirmos uma teoria completa será o triunfo definitivo da razão humana – pois então nós deveremos conhecer a mente de Deus”.
Embora em seu próximo livro (The Great Design) ele tenha mudado um pouco de opinião e diga que Deus não foi obrigatoriamente necessário na criação do universo, Hawking ainda não O descartou completamente. Ele continua mantendo Deus para explicar o inexplicável.

Ateísmo pseudo-religioso

Mas vamos agora ao ateísmo pseudo-religioso. Esse é o praticado pelos religiosos que não acreditam na ciência. Ora! Como entender o mundo se não o trabalharmos de forma prática? Para que serve nossa inteligência, nossa criatividade, nossa capacidade de raciocínio, se não for para produzirmos algo em prol da melhoria das condições de nossa própria sobrevivência?
Como poderá um religioso contribuir para o bem da humanidade se ele se mantém de “braços cruzados” aguardando a providência Divina. É preciso lembrar que temos pernas para andar, braços para carregar as coisas, cérebro para raciocinar, criar, descobrir e inventar... E também, eventualmente, até para orar... Mas... Só para orar?
Onde está a nossa responsabilidade para realizar as tarefas do mundo, para criar novas formas de tratamento médico, para reduzir a mortalidade infantil? Será que toda essa nossa capacidade intelectual foi criada para aprendermos a “cruzar os braços” e esperar que a providência Divina cure nossos enfermos, pague nossas dívidas, forneça a nossa comida e construa nossas casas?
Nossa capacidade intelectual existe para ser utilizada em prol da humanidade e, para isso, precisamos estimular a pesquisa, o conhecimento científico, o questionamento de mundo, sem medo de tais atitudes eliminarem nossas crenças. Quem perde sua crença ao avançar nos estudos, nunca teve crença real nenhuma. Foi apenas acostumado a acreditar em algo que nunca entendeu como verdade! Isso é uma ignorância teológica e nunca religiosidade!
Portanto, não permitir o estudo dos resultados das pesquisas científicas é um radicalismo destruidor da inteligência humana. Ignorar a seleção natural observada por Darwin, assim como não permitir o estudo das novas teorias sobre a origem do universo, é um verdadeiro retrocesso na caminhada do conhecimento!

Como anda esse ateísmo no mundo

O ateísmo pseudocientífico tem um propagandista atuante muito famoso, Richard Dawkins, autor de “Deus, um delírio”. Sua maior preocupação é insistir na eliminação das religiões e da crença em Deus, elementos que ele considera os responsáveis pelo atraso da humanidade e o maior causador de todos os males do mundo!
O ateísmo pseudo-religioso tem propagandistas em todas as esquinas onde se instala uma igreja de “fundo de quintal”. Religiosos evoluídos sabem que ciência e religião não se contradizem, mas se complementam enquanto não surgem as comprovações científicas dos eventos ainda na esfera do incompreensível.
Cientistas evoluídos sabem que há fatos ainda incompreensíveis, e sempre os haverá. E entendem, também, que alguns desses fatos podem vir a causar angústias e, por isso mesmo, precisam de dogmas religiosos para trazer a paz aos corações de grande parte da humanidade.
Esses cientistas sabem, também, que o conhecimento tradicional (religiões antigas) apresenta explicações teológicas que precisam ser periodicamente analisadas pela ciência, tanto para encontrar razões científicas para os fatos, como para encontrar razões contestatórias. Tudo é lucro para a humanidade. Ignorar é um atraso de vida!
Nossas faculdades de sociologia, filosofia e história concentram os maiores índices de ateísmo pseudocientífico. Alguns desses formandos licenciados já vão para as escolas com uma bagagem pesadíssima de materialismo atuante!
Os que escorregam nas calçadas e acabam entrando nessa igrejas de “fundo de quintal” já chegam nas escolas munidos de todo um aparato moralista-religioso mais intransigente ainda do que os materialistas, tentando impingir nas crianças a ideia de que tudo é proibido e que todos precisam se converter para conseguir a “salvação”.
No mundo a divisão maior está claramente definida entre Europa: materialismo exacerbado; e Estados Unidos: religiosidade intransigente. Enquanto grande parte das escolas europeias proíbe o ensino dos conceitos religiosos, nos Estados Unidos se dá o inverso, havendo movimentos grandes para negar o estudo do evolucionismo e da criação do universo a partir do Big Bang!
Quanta intransigência! Precisamos eliminar esses extremismos e dar oportunidade a nossas crianças e adolescentes de estudar todas as faces da mesma verdade, principalmente para que sempre saibam que, por mais que nós estejamos certos de nossas opiniões, sempre poderá haver outras verdades, mais verdadeiras ou menos verdadeiras do que a nossa, a depender do ponto de vista, mas que todas precisam ser respeitadas.

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